O tema do creditamento do ICMS nas operações em substituição tributária para a frente foi recentemente revisitado pelo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do REsp 525.625/RS, pela 2ª Turma, em sessão do último dia 9 de agosto.
O ponto que chamou a atenção não foi tanto o cerne do direito de creditamento, matéria que já fora analisada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do Tema nº 201, em sede de repercussão geral, mas a necessidade de observância ou não do artigo 166, do Código Tributário Nacional.
O STJ vinha acatando o direito de creditamento, mas impunha aos contribuintes a prova da transferência jurídica da titularidade do crédito, prova esta bastante complexa de ser demonstrada, mais ainda em relação ao ICMS.
Para entender a dificuldade que enfrentavam os contribuintes, é importante esclarecer que, nas operações afetadas pela substituição tributária, o responsável/substituto recolhe o ICMS das operações subsequentes sobre uma base fictícia, enquanto o substituído suporta economicamente o imposto. Pondera Sacha Calmon Navarro Coelho que, nessa situação, “o substituto não paga com dinheiro dele, senão que do substituído, de quem recupera o que despendeu”, do que se deflui cenário fático em que a repercussão é econômica, plausível, possível, mas juridicamente incomprovável.
São inúmeros os casos em que os contribuintes, mesmo com o direito reconhecido pela Suprema Corte, por ocasião do julgamento RE 593.849, em meados de 2017, deixavam de ter acesso ao direito de creditamento, justamente pela dificuldade de se comprovar a ausência de repasse econômico.
O julgamento recente, porém, traz uma perspectiva diferente do que o tribunal vinha, até então, implementando.
A ministra Assusete Magalhães afastou a necessidade de cumprimento do indigitado artigo 166, pelo fato de não se tratar de pagamento indevido, mas tão somente exercício, pelo substituído, de creditamento da diferença entre os ICMS-ST presumido e o efetivamente realizado, hipótese esta descrita no artigo 10º, da Lei Complementar 87/96, a Norma Geral Tributária do ICMS, tendo sido acompanhada pelos ministros Og Fernandes e Mauro Campbell Marques.
A decisão serve de marco importante, não como simples acatamento da tese assentada em repercussão geral, mas como mudança de paradigma, afastando a necessidade de evidenciar a transmissão do encargo financeiro imposta aos contribuintes para alcançar os créditos almejados.
A celeuma chegou a ser apresentada perante o Superior Tribunal de Justiça através da Controvérsia nº 430, no REsp 1.989.421/MG, tendo por relator o ministro Francisco Falcão, e por descrição “Necessidade de observância do que dispõe o artigo 166 do CTN nas situações em que se pleiteia a restituição/compensação de valores pagos a maior a título de ICMS no regime de substituição tributária para frente quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”. O estado do Rio Grande do Sul chegou a pedir nova suspensão do julgamento do recurso especial até que se decidisse a controvérsia, no que foi unanimemente ignorado.
A decisão parece redesenhar a interpretação da 2ª Turma do STJ, não mais obrigando a difícil comprovação da ausência de repercussão econômica para — e é importe que fique claro — as operações submetidas à incidência do ICMS com substituição tributária para a frente, modalidade que já traz em si grau de complexidade bastante elevado, servindo a nova orientação com uma forma de desburocratizar a retomada de créditos pagos a maior, reduzindo incerteza, indignação e insegurança.
O precedente traz importante divisão entre 1ª e 2ª Turmas do STJ, e eventual conversão da controvérsia em recurso repetitivo poderia decidir, de forma definitiva, a orientação do tribunal sobre o tema, para que os contribuintes não se encontrem enleados pela variável do acaso jurisprudencial.
Fonte: https://www.conjur.com.br/2022-set-17/simei-silva-creditamento-icms-substituicao-tributaria